Do Site da BBC Brasil
Thomas Pappon
Enviado especial da BBC Brasil a Roma
Atualizado em 12 de
março, 2013 - 03:30 (Brasília) 06:30 GMT
Os cardeais Angelo Scola, da Itália, e Odilo Scherer, do
Brasil são favoritos no conclave
"Está na hora de (a Igreja Católica) mudar", disse
à reportagem da BBC Brasil em Roma a turista americana Shannon, de San
Francisco, sugerindo o exemplo da escolha de Barack Obama para a Presidência
dos Estados Unidos como inspiração ao mundo católico.
O Vaticano, porém, não é uma democracia, e
"mudança" é um termo usado notoriamente com cuidado e parcimônia pela
Igreja Católica que,, nesta terça-feira, dá início ao processo de escolha do
seu novo líder, via voto secreto, por um grupo exclusivo de homens com mais de
50 anos - todos nomeados por um dos dois pontífices anteriores, Bento 16 ou
João Paulo 2º.
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Cento e quinze cardeais de 51 países participam juntos ao
longo do dia de vários rituais no Palácio Apostólico em Roma, para depois se
reunir a partir das 16h30 (12h30 em Brasília) a portas fechadas na Capela
Sistina e fazer uma primeira votação.
As votações se repetem nos próximos dias, sempre duas pela
manhã e duas na parte da tarde, até que um dos cardeais presentes receba mais
de dois terços dos votos, ou seja, 77 votos.
Neste caso, esse cardeal será abordado pelo cardeal sênior
do conclave, o italiano Giovanni Battista Re, com a pergunta, "você aceita
sua eleição canônica como Supremo Pontífice?", seguido, no caso de
resposta positiva, da pergunta "por qual nome você quer ser
chamado?".
O "habemus papa (temos papa)" é anunciado ao
mundo, primeiro, com a fumaça branca da chaminé da Capela Sistina e o badalar
dos sinos da Basílica de São Pedro e, depois, com a revelação pública do eleito
pelo seu nome em latim (no caso de dom Odilo Scherer, seria "Lord
Odilonem") através do protodiácono, o francês Jean-Louis Tauran, aos fiéis
na Praça São Pedro.
Favoritos
E, assim, o mundo católico terá, provavelmente até o final
desta semana, um novo papa.
Como não há "pesquisas de opinião" na Igreja, e já
que os cardeais eleitores são rigorosamente proibidos de fazer qualquer
comentário sobre suas preferências ou o processo eleitoral, resta ao mundo - e
às casas de apostas - confiar nas interpretações de especialistas em assuntos
do Vaticano, os "vaticanistas".
Mas eles podem errar feio. Um dos vaticanistas mais
respeitados do mundo católico, por exemplo, o americano John Allen, da CNN e do
National Catholic Reporter, lembrou, em recente entrevista à BBC, que tinha
dito, pouco antes do conclave de 2005, que o alemão Joseph Ratzinger
"nunca seria papa".
Os favoritos desta vez seriam o arcebispo de Milão, dom
Angelo Scola, o arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, o húngaro Peter Erdo
e o canadense Marc Ouellet.
Dessa pequena lista, curiosamente, o candidato mais
identificado com a bandeira de reformar a Igreja - em particular a sua
"máquina burocrática", a Cúria, o órgão administrativo da Santa Sé -
seria justamente o italiano, Angelo Scola.
A percepção popular, expressa com clareza à reportagem da
BBC Brasil nas ruas de Roma, é de que o candidato "da mudança" seria
dom Odilo Scherer, pelo simples fato de vir de uma região "nova",
"vasta" e "dinâmica", pouco representada na atual estrutura
de comando da Igreja.
Scherer começou a despontar como favorito há poucas semanas,
indicado por jornais e vaticanistas como candidato de uma poderosa trinca
formada pelo Decano do Colégio dos Cardeais, Angelo Sodano, o cardeal que
comandará o conclave e ex-prefeito da Congregação dos Bispos, Giovanni Battista
Re, e um suposto ex-inimigo declarado de Sodano, o ex-secretário de Estado
Tarcisio Bertone, três figuras fortemente ligadas ao papa João Paulo 2º e que
teriam perdido infuência sob o papado de Bento 16.
Os três estariam apostando suas fichas em um candidato
"jovem", com boas chances, visto como "moderado" no
Vaticano - e "conservador" no Brasil - e que teve contato próximo com
Re e Sodano quando serviu na Cúria em Roma, de 1994 a 2001.
"A candidatura do cardeal Scherer pode sinalizar, para
fora, uma renovação" diz a revista online alemã Katholisches, "mas
que visa, pelo menos para algumas constelações do poder, deixar tudo como está
ou mesmo tudo como era antes".
Scola, pelo outro lado, mais próximo a Bento 16, seria o
candidato dos cardeais "reformistas" segundo os jornais italianos,
pelo que puderam concluir das reuniões pré-conclave do Colégio Cardinalício.
Uma polarização entre esses dois lados no conclave pode
acabar abrindo caminho para um terceiro candidato, e é aí que estariam as
chances do húngaro Erdo, sergundo John Allen um candidato "com boas
ligações com cardeais da África e de alguns países latino-americanos" e
"que se mostrou um bom administrador, que sabe ser o suficiente determinado
para fazer as coisas andarem", ou do canadense Ouellet, candidato "do
Novo Mundo", "homem de grande fé espiritual" e do time dos
reformistas.
'Maria-vai-com-as-outras'
A Igreja nunca revelou detalhes sobre os conclaves
anteriores, os registros de votações passadas existem, mas são mantidos a sete
chaves.
Informações vazadas para a imprensa do diário de um
cardeal-eleitor pouco após o conclave de 2005 deram a entender que Ratzinger
ganhou após crescer de pouco menos de 50 votos na primeira rodada para 65 na
segunda e 84 na terceira, a derradeira, derrotando com facilidade um único
rival, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio - que também participa deste
conclave.
Um artigo do americano National Catholic Reporter da semana
passada cita esses dados para reforçar as conclusões de um estudo publicado em
2006 por uma pesquisadora australiana, J.T.Toman, sobre a psicologia dos
conclaves.
Ela analisou padrões de votação com base em dados vazados de
conclaves anteriores e concluiu que os cardeais adotam um comportamento na
linha "maria-vai-com-as-outras" quando o seu candidato preferido sai
do páreo.
A partir do momento em que os votos começam a despontar para
um candidato único, a tendência é votar nele.
Duração
A outra explicação, a oficial, é de que o "Espírito
Santo" direciona o voto dos cardeais que, pelo menos na Era Moderna, têm
sido relativamente rápidos na escolha.
Dessa vez, entretanto, há bons argumentos para prever tanto
um conclave breve quanto um mais longo.
O vaticanista do jornal italiano La Stampa, Giacomo Galeazzi,
disse à BBC Brasil acreditar que este conclave "será rápido", porque
"depois dos escândalos (de abusos sexuais e os supostos casos de corrupção
revelados por documentos vazados por um mordomo de Bento 16, no caso conhecido
como Vatileaks), a Igreja vai querer mostrar união e os cardeais vão tentar
escolher um papa o mais rápido possível".
Já Robert Mickens, colunista em Roma do semanário católico
britânico The Tablet, disse à BBC Brasil que este "será um conclave mais
longo do que o últimos". "Não há candidatos realmente favoritos. Eles
levarão tempo para chegar a um nome, em meio às divisões entre os cardeais
próximos à Curia e os que querem reforma".
John Allen disse à BBC acreditar que este conclave seja
longo pelo fato de incluir cerca de 50 cardeais que participaram de um conclave
anterior. Eles não permitiriam que alguém "direcionasse" ou
"liderasse" as discussões, como foi o caso no conclave de 2005 - que
tinha apenas dois "veteranos" entre um grupo grande de marinheiros de
primeira viagem.
Um debate mais robusto dificulta o consenso, diz Allen.
Desde a entrada no século 20, três conclaves duraram apenas
dois dias - entre eles o que elegeu Bento 16 em 2005 -, e apenas dois conclaves
(1903 e 1922) tiveram a duração máxima até agora, de cinco dias.
Aqui vale apontar para uma outra diferença importante entre
a eleição de um presidente nos Estados Unidos e a de um novo papa: um ganha um
mandato por tempo fixo, o outro, um cargo para a vida inteira.
Quando um presidente eleito decepciona, é tirado do cargo
após quatro anos. Já um papa só sai se quiser.